A discussão desse tema parece infindável: se a forma como se dá a
incidência do ISS nos serviços prestados por sociedades profissionais
deve ser fixa, como pretendem essas sociedades, ou proporcional ao seu
movimento econômico, como pretendem os municípios.
Essa discussão tem por objeto vários limitadores criados de forma
reiterada e sucessiva pelas autoridades fiscais municipais para impedir
ou, pelo menos, restringir a aplicabilidade dessa tributação fixa.
Fundamentando-se
nesse inconformismo, já se buscou, entre outras tentativas, desde a
obtenção da declaração de inconstitucionalidade da norma que a prevê,
porque não teria sido recepcionada pela CF/88, que expressamente veda as
denominadas isenções heterônomas, ao reconhecimento de que essa norma
teria sido revogada pela LC 116/03.
Nenhuma dessas tentativas prosperou.
De
fato, a regra de tributação fixa foi declarada em absoluta conformidade
com a CF/88 pelo STF, no julgamento do Recurso Extraordinário (RE)
236.604-PR. Nessa decisão, reconheceu-se expressamente que o parágrafo
3º do artigo 9º do DL 406/68, que prevê a tributação fixa, não colidia
com o artigo 151, III, da CF/88, que trata da proibição da referida
isenção heterônoma.
Da mesma forma, reconheceu-se, agora no âmbito do
STJ, que a referida norma não foi revogada pela LC 116/03 e que
continua em pleno vigor. É o que se verifica nas ementas de jugados de
ambas as Turmas daquele Tribunal:
O art. 9º, §§ 1º e 3º, do
Decreto-Lei n. 406/68, que dispõe acerca da incidência de ISS sobre as
sociedades civis uniprofissionais, não foi revogado pelo art. 10 da Lei
n. 116/2003. (Recurso Especial – REsp nº 713.752/PB Segunda Turma –
23.06.2006 – Diário da Justiça – DJ de 18.08.2006, p. 371)
A LC 116,
de 2003, não cuidou de regrar a tributação do ISS para as sociedades
uniprofissionais. Não revogou o art. 9º do DL 406/68. (REsp 1.016.688/RS
– Primeira Turma 06.05.2008 Diário de Justiça-DJe de 05.06.2008)
A
questão que vem sendo discutida nos últimos anos (e que será tratada
neste artigo) diz respeito à tentativa de restrição à aplicação da regra
de tributação fixa às sociedades que tenham a denominada natureza
empresarial ou mercantil.
Em relação a algumas espécies de sociedades
profissionais cujas atividades são regidas por legislação que
expressamente exclui a possibilidade de adoção da forma mercantil, a
discussão ora examinada não encontra qualquer amparo. Isso porque a
jurisprudência pacífica do STJ é no sentido de que, nessas hipóteses,
não há que se falar em natureza empresarial:
5. As sociedades de
advogados, qualquer que seja o conteúdo de seus contratos sociais, gozam
do tratamento tributário diferenciado previsto no art. 9º, §§ 1º e 3º,
do Decreto-lei n.º 406/68 e não recolhem o ISS sobre o faturamento, mas
em função de valor anual fixo, calculado com base no número de
profissionais integrantes da sociedade. (Recurso Especial nº 724.684/PB
Segunda Turma – 03.05.2005 – Diário da Justiça de 14.06.2005)
Citamos, ainda, o seguinte trecho do voto do ministro Castro Meira no precedente acima:
As
sociedades de advogados, qualquer que seja o conteúdo de seus contratos
sociais, gozam do tratamento tributário diferenciado previsto no art.
9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-lei n.º 406/68. Como são necessariamente
uniprofissionais, não possuem natureza mercantil, sendo pessoal a
responsabilidade dos profissionais nela associados ou habilitados, não
recolhem o ISS sobre o faturamento, mas em função de valor anual fixo,
calculado com base no número de profissionais.
Pela mesma razão, a
legislação do município de São Paulo (Lei 15.406, de 08.07.2011, que
alterou a Lei 13.478, de 30.12.2002) expressamente excluiu essas
sociedades da tributação proporcional sobre o faturamento, conforme se
verifica na redação do art. 15, § 9º, abaixo transcrito:
art.15 (…), §
9º – Os incisos VI e VII do § 2º e os §§ 7º e 8º deste artigo [que
tratam da exclusão do regime de tributação fixa por demonstração de
caráter empresarial] não se aplicam às sociedades uni-profissionais em
relação às quais seja vedado pela legislação específica a forma ou
características mercantis e a realização de quaisquer atos de comércio.
A
discussão sob exame se põe para as demais sociedades prestadoras de
serviços profissionais, que, por apresentarem determinadas
características que, no entender do Fisco, atribuiriam a elas natureza
empresarial, são autuadas por pagarem o ISS sob a modalidade fixa, e não
proporcional ao seu faturamento.
Tais características variam desde a
forma com que a sociedade é constituída (LTDA, por exemplo), a
denominação que se atribui ao estabelecimento (clínica, para os casos
dos médicos e odontólogos), até os parâmetros utilizados por seus sócios
para distribuírem os lucros entre si (se proporcionalmente ao serviço
prestado por cada um em nome da sociedade, ou se proporcionalmente à sua
participação no capital social).
Nenhuma dessas características tem
qualquer relevância para atribuir-se a essas sociedades natureza
empresarial e, consequentemente, inseri-las nas regras de tributação
proporcional.
Para melhor compreensão do que realmente é essencial
para esse fim, é mandatória a verificação de como se deu a evolução
histórica das regras que regulam essa incidência, bem como o exame da
forma como a lei civil define as chamadas sociedades empresárias.
Em
sua redação original, o CTN estabeleceu uma ampla base de incidência
para o ISS. O seu artigo 71, parágrafo 1º, inciso I, considerava sujeito
à incidência do imposto o fornecimento de qualquer espécie de trabalho a
usuários ou consumidores finais.
Regra geral, a base de cálculo do
ISS era o preço do serviço. Todavia, para evitar a sobreposição de
incidências, quando se tratasse de prestação de serviço sob a forma de
trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto era calculado por
meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço e
outros fatores pertinentes, não compreendida nestes a renda proveniente
da remuneração do próprio trabalho (art. 72 do CTN).
Sobre esse
objetivo, o de evitar a sobreposição de incidências tributárias, Rubens
Gomes de Sousa, relator do anteprojeto que se transformou na Lei
5.172/66 (CTN), em parecer publicado na Revista de Direito Público 20,
em 1972, intitulado O Imposto sobre Serviços e as Sociedades Prestadoras
de Serviços Técnicos Profissionais, assim se manifestou:
5.1. O ISS
foi instituído pela reforma tributária promulgada pela emenda n. 18, de
1º.12.1965, à Constituição de 1946 e complementada pelo Código
Tributário Nacional (CTN), Lei nº 5.172, de 25.10.1966. A comissão, de
que fui relator, que projetou a reforma, consignou expressamente que o
ISS destinava-se a substituir o antigo imposto de indústrias e
profissões, que, pela imprecisão constitucional de sua incidência e
conseqüente indefinição de sua base de cálculo, se havia convertido no
exemplo mais flagrante da inadequação da discriminação das competências
tributárias de governos diferentes. Com efeito, os dois aspectos
referidos permitiam que o imposto de indústrias e profissões viesse
sobrepor-se a tributos reservados a outros poderes que não o Município,
notadamente, no campo das atividades comerciais, ao IVC; e, nesse campo e
também no das atividades profissionais de prestação de serviços,
calculado como era, via de regra, sobre o chamado movimento econômico
equivalente à receita bruta confundir-se com o imposto federal sobre a
renda e proventos de qualquer natureza.
Fonte: http://www.impostoderenda.org .
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